terça-feira, 9 de dezembro de 2014

A minha Prada pago eu


Pelo direito de conquistar minhas próprias coisas com o dinheiro, fruto do meu trabalho, sem precisar do cartão de um macho provedor (ou de qualquer outra pessoa)


Certa vez, meu chefe contou-me que na noite anterior havia jantado em um dos restaurantes mais chiques da cidade, onde se deparou com uma mesa de cinco ou seis mulheres sozinhas, que se divertiam felizes, com suas taças de pro seco e suas bolsas Prada, em plena noite de segunda-feira. Segundo ele, gastando todo aquele disparate com o cartão dos maridos.

A primeira pergunta que me veio foi: por que elas não poderiam estar gastando seu próprio dinheiro? Quem garante que elas não fossem gerentes da inúmeras multinacionais presentes na cidade? Por que, em pleno 2014, uma mulher com dinheiro, que se diverte com as amigas, precisa, necessariamente, ser julgada como aproveitadora?

Diante da minha pergunta, sua expressão foi de: “até parece! Se via que não que era o caso”. O que me irritou ainda mais. Essa falta de credibilidade que a figura feminina ainda representa, para algumas pessoas, é algo que me causa uma enorme revolta. Como se não fôssemos capazes de conquistar sucesso pessoal e profissional por nossos próprios méritos.

O machismo está presente em minha vida como o pão em minha mesa. Desde sempre. Do tratamento recebido em casa, se comparado aos meus irmãos, à diferença salarial ou à minha voz que não foi escutada durante uma reunião, mesmo que a ideia dada fosse sensacional e só considerada quando proposta, meia hora depois, por um colega homem e, por isso, mais merecedor de credibilidade. Viver isso todo dia é revoltante, embora até eu mesma tenha levado um certo tempo para entender que não, não é justo e não tem que ser assim. Tornar-me feminista foi então inevitável. E totalmente necessário.

Fato é que o machismo me cansa. O machismo me enoja. O machismo me deixa, cada vez mais, intolerante. A ponto de abrir uma discussão com o chefe. Alguém a quem devo respeito, por mais que suas colocações me façam querer vomitar.

Em Milão, na agencia de comunicação em que trabalhava, éramos muitas mulheres, lideradas por chefes extremamente machistas e costumávamos frisar que uma mulher, por mais que seja boa no que faça, precisa ser melhor que o homem, naquela mesma função, ao menos 10 vezes, para ter metade do reconhecimento que ele recebe. (Fora isso, “precisamos” fazer também muitas outras coisas, não destinadas a eles. Como ser mãe, amante, feminina, prendada, bonita, magra e gostosa).

Ao mesmo tempo, é o mais completo paradoxo pensar que em quase todas as empresas nas quais trabalhei, tive chefes mulheres. Inteligentes, independentes e competentes. Mas ainda assim pouco verossímeis. Mulheres que poderiam bancar sua própria Prada, seu próprio pro seco e, sobretudo, mulheres nas quais me espelho.

Uma delas costumava dizer que “não basta ser, tem que parecer”. Guardei muito bem essa frase. Não é uma questão de competir com o homem. Não é isso o feminismo. É uma questão apenas de ser respeitada, ouvida e não ser prejulgada. É uma questão de mostrar o nosso valor doa a quem doer e mostrar que podemos jantar “sozinhas”, apenas umas com as outras, no melhor restaurante da cidade sem que um macho patrocine.

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